Musk & Moraes

 

Elon Musk acha que vai dar exposed no Alexandre de Moraes publicando despachos que traem a lei e o povo brasileiro. Desconheço exatamente o que está sendo traído, mas desconfio que ele esteja falando de liberdade de expressão. Por liberdade de expressão talvez ele entenda aquela garantida nos EUA, mas o problema é que essas modernidades tecnológicas de país gringo não existem por aqui. Como o interesse soberano do povo brasileiro pode estar sendo traído também não sei, porque se há coisa que o brasileiro mais adora é uma censurinha, aquela botina legal viril e lustrosa chutando gostoso a bunda dos Monarks, dos desafetos e dos não alinhados. 

Liberdade de expressão, a que existe lá nos EUA, nada mais é do que a proteção ao direito de ofender, pois discurso que não ofende nunca precisou ser protegido. Não existem outros tipos de liberdade de expressão, pois, uma vez que você cerceia o direito de ofender, a liberdade de expressão falece. Ofensa é coisa subjetiva e infinitamente elástica, portanto inservível como critério limitador do direito de livre manifestação do pensamento garantido na Constituição brasileira, mas esse não é o entendimento consagrado em nosso ordenamento jurídico.

Brasileiro se acha primeiro mundo, portanto também adora fazer pose e dizer que defende o direito de ofender. É tudo manha, uma encenaçãozinha barata e ordinária, fato para o qual temos massiva evidência na legislação vigente. A lei que criminaliza a injúria, por exemplo, que contém agravantes para injúria por motivos de raça, etnia e religião, nada mais é do que a criminalização da ofensa. A regra é flagrantemente inconstitucional, já que tal coisa é incompatível com as garantias previstas no art. 5º da Carta Magna, mas como não tenho lugar de fala nem lugar de caneta, então é constitucional e ponto final.

Ofender mulher na residência também não pode de acordo com a lei Ofendida da Penha. Se você descobrir que sua esposa trabalha na zona e usar a palavra com P para se referir a ela, você é um creminoso. É irrelevante aqui se você disse a verdade, pois a lei protege até mesmo o direito da cortesã de não se sentir ofendida por ter sido identificada como profissional do ramo. O mesmo ocorre com mulheres na política. Quando você diz que uma deputada corrupta e incompetente é corrupta e incompetente, isso é crime de violência política de gênero, uma agressão a todas as mulheres. A regra, como sabemos, é clara: se uma é corrupta e incompetente, todas, digo, se ofendeu uma, ofendeu todas. 

Vejamos: não é possível ofender por razões religiosas, não é possível ofender por razões políticas, raciais, étnicas e, sobretudo, não é possível ofender mulheres. Em resumo, não é possível ofender ninguém, pois ofensa é crime, um crime de natureza subjetiva cuja tipificação e gravidade ficam submetidas aos subjetivos e arbitrários critérios do ofendido e do julgador da ofensa. Sendo assim,  quando alguma autoridade se sentir injuriada com qualquer discurso e passar o canetaço para lhe dar o corretivo que você acha que injuriadores merecem, não reclame, pois isso nada mais é do que a expressão dos valores institucionais e culturais que brasileiros defendem. 

Alexandre de Moraes representa o povo do Brasil, seus valores e as instituições legais com desenvoltura e competência, então porque esse indivíduo tem desafetos por aqui é algo difícil de entender. Brasileiros insatisfeitos com Moraes não têm problema algum com a maneira com que ele exerce suas funções. O problema não é a Constituição ou as instituições não estarem funcionando, o problema é não estarem funcionando em favor dos insatisfeitos, e é isso que Elon Musk não entendeu sobre o Brasil.

O que entendo sobre o Brasil é que quero um outro Brasil. O Brasil que eu quero é um com liberdade de expressão nos moldes americanos. Eu quero um país onde todo brasileiro que se sentiu ofendido com qualquer discurso, por mais abjeto e abominável que seja, tenha o direito sagrado, inviolável e inalienável de ir se catar, porque liberdade de expressão é incompatível com fiofó ardido, cocô mole, beiço caído e mimi dodói.

Sei que isso é um delírio, e por saber que é um delírio é que eu sei que o Moraes é um exemplo de profissional do Direito no Brasil. Definitivamente não me representa, mas se representa os valores do brasileiro médio - independente de pólo político - aí a culpa não é minha. Como sempre, a culpa é do machismo da sociedade patriarcal opressora branca cisheteronormativa descapilarizada.

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