Leandro Kantante

 


Karnal está lendo Clarice Lispector, mulher que viveu no início do século passado (1920-1977). Como está hoje não sei, mas cantar mulheres era esporte nacional na Itália. Ragazzos concorriam entre eles para saber quem era o mais cantante, e é claro que as ragazzas não só aprovavam, como adoravam, algo incompreensível hoje para feministas. Ser cantada na Itália era quase que uma atração turística, então provavelmente essa é uma das razões pelas quais Clarice estava se turistando toda em Nápoles. Ligeira essa menina, além de viajada.

A experiência foi tão marcante que teve que registrar em livro, que tem o sugestivo título de "Aprendendo a Viver". Se pegar qualquer piriguete de rede social hoje, colocar em uma máquina do tempo, e mandar para a Nápoles da época de Clarice, ela voltará dizendo que sofreu violência de gênero, que homens são escrotos e que a masculinidade é tóxica, pois não conseguiria nem mesmo comprar pão sem receber um galanteio épico do padeiro. Ragazzo na Ferrari até passa, pois a escuderia é italiana e lá é a Itália, mas cantada de padeiro ultrapassa todos os limites do que modernetes são capazes de conceber, que dirá tolerar.

Naquele tempo não tinha Instagram nem Tinder, então meninas tinham que obter validação masculina de outras fontes. Qualquer baranga hoje passa um filtro de photoshop e recebe validação massiva online do gado desesperado. Isso infla seu ego artificialmente, criando a ilusão de que seu valor no mercado sexual é muito maior do que é de fato, algo do qual teriam consciência se tivessem que disputar likes na rua à tapa, sem filtro, como faziam suas ancestrais. Além de crescer ouvindo que é uma deusa, a mulher moderna também cresceu ouvindo que masculinidade é uma doença. Como iniciar interação com mulheres é uma das expressões mais básicas da masculinidade, cantada só pode ser assédio, e mesmo um simples elogio à beleza, ainda que sem segundas intenções, é uma blasfêmia, herético ato de violência contra as divinas colheres com filtro. 

Nos EUA, cantar mulheres na rua hoje é suicídio. Até onde eu sei, o americano nem mesmo aborda mais estranhas em lugar nenhum, mesmo em ambientes como bares e casas noturnas. Interações com mulheres, somente online, então essa enquete do Karnal sobre a melhor cantada já recebida está meio deslocada no tempo, embora tenha recebido uma chuva de reações positivas. Pelo que eu vi, todas são mulheres em torno dos quarenta mais pra mais, algumas um pouco menos, suspirando ao relembrar os bons momentos que não voltam mais. Com o objetivo de embasar meus estudos de capivarologia arqueológica avançada, separei algumas respostas para futura referência. A lista não tem o padrão olímpico dos italianos, mas já serve como registro de um mundo não muito distante em que as ruas eram terra sem lei, a regra era que não tinha regra, o tiroteio rolava solto, e salve-se quem quiser.  

- A senhora é muito linda!
- Não sabia que as flores caminhavam. 
- Onde é o cartório? Se você for comigo eu caso com você.
- Mãos ao alto sua linda! 
- Deus caprichou na Natureza, mas contigo ele abusou.
- Não sou bandeirante em busca de esmeraldas, mas você é a joia mais preciosa que encontrei.
- Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça.
- Tu come rato? Porque você é gata...
- Uma mulher como você tenho vontade de escalar.
- Você não é uma cerveja, mas é uma paixão nacional!
- Se os olhos são de mel, a abelha volta?
- Olha, pai, ela parece uma sereia! (pirralho prodígio de seis anos na piscina dando pedrada de funda em uma tia, provavelmente agindo em conluio com o pai, que estava de olho na sereia)
- Um anjo só podia descer no paraíso. (anjinho levando flechada mortal ao descer do metrô)
- A Volks agora fabrica avião? (funcionária da VW sendo atropelada ao aterrissar na rua após o expediente)
- Que coroa gostosa! (A tia ficou sem saber se ficava feliz com o gostosa ou furiosa com o coroa, mas deu risada, então tá faturada)

And the Oscar goes to essa tia alvo de um mineiro com nervos de aço:
 - Posso fazer três perguntas?
 - Pode.
 - Qual seu nome? Me dá um beijo? Não por quê?

Mito. Mito puro esse mineirinho. Quando é dá ou desce, normalmente elas descem, mas nem todas. Pois então. Eu apelidaria esse soldado de 007, mas nos EUA receberia hoje o título de Vento Divino, popularmente conhecido como Kamikaze.

Postagens mais visitadas deste blog

O Fardo da Mulher Extrovertida

Calabresa Fagundes

Iara Dupont

A Casada e o Shortinho

O Mundo de Cinderela